Sábado, 11.02.2012 - Gira de Cigano.

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Exu.

Texto escrito pelo já falecido Pai de Santo Andir de Souza, segundo chefe de terreiro de nossa tenda.
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                                                 EXU.

Falar de Exu não é uma fácil tarefa, porém, inquerir, pesquisar, procurar sua origem e sua finalidade é o direito de quem quer aprender.

Há uma nuvem cobrindo a distância do seu princípio até nossos dias.

Nesta caminha lenta da humanidade ganhastes muitas formas e fostes batizado com inúmeros nomes: no Jardim do Éden, era uma serpente que introduziu o primeiro pecado no seio da humanidade. Eras o agente, mas não o mal, pois o livre arbítrio nos dá o direito de optar.

De Adão e Eva proliferou a humanidade e, com ela os seus deuses, seu medo e sua curiosidade.

Ah! meu irmão de longa caminhada...

Para Moisés você foi a bengala que apoiava o corpo nas fatídicas andanças, mas, se necessário, você seria também a assustadora serpente. Para os fenícios, você foi Molock, espírito tenebroso, cujo interior era uma fornalha ardente, onde os seus seguidores depositavam suas oferendas. Para a Pérsia de Zoroastro, atendias pelo nome de Arimâno, espírito angustiado e vingador! Para o Egípcio você era Duet, guardião que castigava, que punia para, depois de punido, ser entregue para o Deus da Luz e Serenidade. Você era a ligação entre o homem e a mente, a morada de Osíris, que é o Deus do amor e da criação.

No Egito você também era Tifon ou Aprites. A China milenar te deu o nome de Digin; Ravana para o hindú. Os escandinavos te chamavam Azalock. Em cada povo uma personalidade e uma vibração diferente.

Para o nosso índio brasileiro, você atendia por vários nomes e várias atuações: Cairé é um fantasma que aprece na lua cheia para punir os maus. Catiti é outro, só visível na lua nova e atrapalha a pesca. Jurupari é o mau espírito que trás pesadelo. Curuganga oficia como assombração.

Até então, você, com múltiplas funções e personalidade, não era mais que uma energia, uma força.

Até 1984 anos atrás você era visto e sincretizado como um guerreiro, como um homem.

Para o mal artista, uma grotesca obra.

O hebreu te deu novas formas e, na pia batismal, recebestes os nomes diabo, demônio, lúcifer.

Pelo pincel do pintor ou forma do escultor, na metamorfose dos interesses de uma religião que amedronta e não esclarecem te fizeram um monstro. Como monstro, você defendia com maior eficácia os interesses econômicos do seu criador.

Causa-nos horripilância vê-lo assim, desfigurado!

A infâmia e o mau gosto do artista que te fez um agregado de homem e animal, como longos cornos e pés caprinos, é uma afronta ao próprio Criador!

Ah! meu amigo... A tua imagem hoje, nada é mais que o reflexo, a exteriorização de consciências mal forjadas.

São dois mil anos que o padre vem te projetando, programando o sub-consciente da pobre humanidade. Ele afirmou que EXU era o diabo e assim se propagou, assim ficou.

Nós só conhecíamos o catolicismo como religião dominante. O padre era sábio, o doutor, o mentor. Enfim, ficaria assim se, ao lado da religião, não existisse a história.

O diabo é uma rival de Deus, um anjo rebelde, Satanás e falsário que tentou Eva e perdeu Adão. Tentou Caim e promoveu o assassinato de Abel. Tentou Jesus no monte e levou Judas à traição. Jesus não cedeu à sua tentação, prova eloquente do direito de optar; respeito sagrado ao livre arbítrio do homem.

Forçam-nos a pensar que você é o executor, porém não é a causa e nem o efeito, é, sim, um elemento, uma vibração, que serve de acordo com a vontade do pedinte ou a licença do patrão. Será isso ou não?

Sabemos que o índio e o negro não conheciam um rival de Deus. Não há um concorrente das Leis Divinas! Um diabo, um satanás... Há sim uma corte de seres inferiores que, por isso mesmo, estão a serviço de seres superiores, aos quais obedecem e servem, sem contestar.

Na magia do negro, Exu é um Deva, um Orixá. É um mensageiro, o guarda, o policia, o moço de recado que vive na rua, orientando, servindo de intermediário entre o Orixá e o homem.

Entendemos que o diabo nos ludibriou!

O negro não sabia que era o diabo, sabe-lo-ia o bugre dispondo de uma mitologia inferior? Não tinham uma noção semelhante.

O bugre conhecia o Caiçoré, Curupira, Curuganga, Anhangá, entidade que se tornam pesadelos, que dão maus sonhos e que estorvam a pesca e a caça, contudo, o homem pode amansá los, dando-lhes pequenas oferendas.

Quem ameaçaria o diabo? Este pretenso rei seria tão porco, tão mesquinho que se venda por alguns bicos de vela? Será isso um rival de Deus? ... Um diabo, um satanás?

O bugre e o negro não conheciam esta figura hebraica, pregada e propagada aos quatro cantos do mundo pelos padres e seus discípulos.

O negro não servia a interesses financeiros. Perante Deus não existe rival. ELE é a Criação, o Princípio e o Fim!

Para cada elemento ELE criou uma força dominante, um encarregado, um guardião, um Orixá que rege o plano Cósmico, mas criou também o intermediário, o EXU, o Deva, o Orixá Menor, que atua em harmonia com seu regente, ou seja, o Orixá.

Lá no alto está a Energia Cósmica, Oxalá, Iemanjá, Ogum, Oxóssi e outros. No plano intermediário, Exu-Tameta, Exu da Rua, Exu-Odé, da encruzilhada, Exu-Ade, do chão, Exu-Ibanan, dos montes, Exu-Itatá, das pedras, Exu-Ibê, do terreiro, Exu-Gelú, Das estradas longas, Exu-Baru, do escuro, Exu-Bará, este, puramente africano.

Senhores, a minha dissertação talvez não seja erudita... tão inteligente... porém, é honesta e eu afirmo: aquele grupo de demônios avermelhado, guampudos, com pés caprinos e barbas em pontas, olhos saltados, dentes agressivos... não é EXU!

Aquilo é uma concepção primária, falsa, mórbida, velhaca, indecente, ridícula! É uma agressão à nossa inteligência; uma infâmia, um disparate, uma ofensa ao Divino Criador!

Não podemos aceitar essa assimilação!

Este demônio hebreu não é o Plutão do grego, não é o Tifon do egípcio, não é o Arimam do babilônio, não é o Digin do chinês, não é o Ravana do hindú, não é o Bará do negro, não é o Caissoré do bugre.

Este demônio bestificador não faz parte deste Pantheon!

Por Deus, não é nada disso! Só pode ser fruto do interesse econômico de escritores mal informados, sem decência ou respeito pelo belo.

Aqui dou meus aplausos àqueles escritores que tiveram a honradez de procurar um novo sincretismo, tentando introduzir uma imagem condizente com o altruístico trabalho desses incansáveis irmão EXUS.

Estamos, realmente, marchando para um novo sincretismo, assimilando-os com guerreiros da época medieval, com seus aparatos bélicos bem limpos, bem penteados...

Se não é original, pelo menos demonstra respeito pela arte.

Estamos tomando como exemplo Seu 7 da Lira, Zé Pilintra e outros que não se assimilam 
à essas figuras horrendas e carentes de bom gostos.

A marcha do tempo se encarregará de expurgar tudo isso no descortinar de um futuro bem próximo. Teremos em nosso meio a imagem verdadeira e há de ser diferente.

Meu amigo EXU!...

Meu fiel Companheiro...

Meu guardião!

Esta é minha oferenda!

Não é a oferenda comum de encruzilhada ou cemitério...

Estou te ofertando a minha voz, o meu saber, o meu raciocínio!

Minha alta contrita reza para você! Não é o melhor, eu sei, porém, o sábio sabe tudo que diz, mas... nunca diz tudo o que sabe!

É, pois, muito simples:
... sou um estudante sedento do saber, não sou um sábio!

SARAVÁ, EXU!

Andir de Souza
Escola de Iniciação Umbandista do Paraná
Rua Panamá, 342
Curitiba - Pr

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